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quinta-feira, 4 de fevereiro de 2016

Bula de remédio - parte 1

Sabe quando você compra um remédio e ao ler a bula descobre que ele pode até resolver o problema X, mas você tomará o risco dos problemas Y, Z, A, B, C...?
Fiquei tonta ao ler o texto abaixo que descreve o quanto as características biológicas da mulher não a favorecem na corrida. Questões hormonais e fisiológicas quase nos colocam na condição de “vá fazer uma caminhada leve em volta do lago que você ganha mais”.
Veja só como somos na comparação com os homens: pouca testosterona, menos músculos, coração menor, menos força, biomecanicamente “incorretas” para a corrida, risco de incontingência urinária e ainda menstruamos!
O que? Então não podemos correr? Opa, isso não!
Temos algumas vantagens (algumas pouco tangíveis, é verdade) quando o assunto é corrida. Libido explode e o sexo aflora, a tolerância à dor é maior, somos mais pacientes na busca do resultado e por aí vai.
No fundo o “sexo frágil” pode correr e alcançar resultados bons ou tão bons quanto os homens têm, mas “o treino da mulher exige mais cuidados, tem de ter um caráter preventivo, mas isso não quer dizer que ela não possa correr tanto quanto o homem”.
Então entendamos mais um pouco sobre as potencialidades e fragilidades femininas e masculinas na corrida. E para que essa “bula” não fique muito longa, vou publicar o texto em duas partes: uma parte hoje e outra na semana que vem. Assim ganhamos fôlego para terminar de entender alguns dos efeitos colaterais femininos!
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As características biológicas femininas não favorecem tanto o desempenho na corrida, na comparação com os homens. Em compensação, elas estão alguns passos na frente em matéria de força mental, dedicação e comprometimento

Que a participação feminina na corrida de rua cresce a passos largos todo mundo já sabe. Mas são passos tão largos quanto os dos homens? E por que elas ainda sofrem mais, se machucam mais e não conseguem competir na mesma velocidade que eles? A resposta está diretamente ligada a questões hormonais (a presença do hormônio sexual masculino, testosterona) e fisiológicas (o tamanho do corpo e a composição corporal).
A mulher produz 85% menos testosterona (principal hormônio relacionado à geração de força) que o homem. Isso está relacionado à menor quantidade de massa magra que elas têm. Com menos músculos, as mulheres são, sim, mais fracas que os homens. Como sabe-se que a produção de força de uma mesma quantidade de músculo não difere significativamente entre pessoas dos dois sexos, chega-se à conclusão de que a força depende muito mais de quantidade do que de qualidade. Isto é, quanto mais músculo, mais força e maior capacidade de gerar trabalho o que reforça a tese elaborada em 1991 pelo fisiologista sul-africano Tim Nokes que diz que corredoras de elite carregam proporcionalmente 5 kg a mais de gordura e 3 kg a menos de músculo que os homens.
Fisiológica e hormonalmente os dois são, sim, diferentes, mas mas isso não quer dizer que as mulheres e o homens precisam ter treinos diferentes. O treinamento pode ser o mesmo, o que muda é a intensidade. A mulher não suporta a mesma carga que o homem, e isso é fisiológico.
Além de uma quantidade menor de músculos, as mulheres também possuem um coração menor — e que, consequentemente, bombeia uma quantidade menor de sangue para o corpo em cada batida —, pulmões menores, 6% a menos de células vermelhas e de 10% a 15% menos hemoglobina por cada 100 ml de sangue. Tudo isso somado acaba gerando um VO2 máximo de 15% a 25% menor que o dos homens.
Não param por aí as diferenças. A mulher tem menos força que o homem, entre 54% e 80%, dependendo do grupo muscular. Tem também pernas mais curtas, o que se reflete na passada menor. Esses fatores explicam por que os homens correm em torno de 10% mais rápido que as mulheres.
Em média, elas são 10 a 15 cm menores, pesam entre 10 e 20 kg menos que os homens e necessitam de menos calorias. Além disso, têm um metabolismo basal cerca de 10% menor e uma parcela de gordura 10% maior, aproximadamente, que a dos homens.
Só isso? Não. Biomecanicamente, as mulheres também agem de outra forma, já que possuem membros mais curtos e superfícies articulares menores, o que diminui a potência. Além disso, os ligamentos são mais frouxos, os quadris mais largos e os músculos vasto medial oblíquo e os abdutores mais fracos. Esses fatores combinados podem predispor a lesões na coluna, quadris, tornozelos, pés e joelhos. No geral, as mulheres têm maior mobilidade, enquanto os homens têm mais força. Isso acontece porque elas têm ligamentos e músculos mais elásticos e flexíveis, devido à menor densidade dos tecidos musculares. Daí surgem as diferenças de desempenho de acordo com as exigências de cada esporte.

Segurando o xixi
De acordo com uma pesquisa da Corpore publicada há cinco anos, 25% das corredoras apresentam perda de urina durante uma corrida e 13% durante os treinamentos. Isso acontece porque o contato dos pés com o solo provoca um impacto maior sobre a pelve, e o estresse e a fadiga muscular durante a prova facilitam a incontinência urinária, já que os músculos do assoalho pélvico são constantemente utilizados durante as atividades físicas.
Toda mulher corredora deve fortalecer a musculatura do assoalho pélvico, musculatura responsável por dar sustentação aos órgãos pélvicos — útero, bexiga e intestino — absorver o impacto e garantir a continência fecal e urinária. Aproximadamente 50% das atletas apresentam queixas de incontinência urinária, constantemente subestimadas, mas que podem levá-las a abandonar o esporte. As corredoras são uma população de risco, pois o ato de correr gera um impacto de três a quatro vezes o peso corporal. Fisioterapeutas especializadas em uroginecologia podem realizar a avaliação dessa musculatura e estabelecer exercícios de fortalecimento.
Menos nutrientes, menos energia Em idade fértil, as mulheres perdem mais sangue quando menstruam, o que eleva a necessidade de ferro e ácido fólico. Porém, muitas delas não conseguem repor a quantidade recomendada de ferro, tornando-se mais suscetíveis à anemia. Daí o cansaço excessivo nos treinos, a falta de disposição e a sensação de fraqueza e até sintomas mais graves.
As mulheres também precisam consumir mais alimentos considerados fontes de vitamina E (como gérmen de trigo, ovos, oleaginosas e óleos vegetais, por exemplo) do que os homens. Essa vitamina atua regulando o nível de prostaglandina, que se eleva durante a menstruação para a contração da parede uterina, provocando dores. O consumo de vitamina E, aliás, pode ser uma alternativa natural para quem sofre de muitas cólicas a ponto de ficar sem treinar.
Há ainda a necessidade maior de vitamina D e de magnésio, nutrientes essenciais para as mulheres, por conta da fixação dos ossos. Isso porque o hormônio sexual feminino, o estrogênio, tem efeito protetor do osso e, com a sua diminuição ou fim da produção (na menopausa), os níveis de cálcio caem drasticamente e sua velocidade de fixação no osso diminui, com a consequente perda da massa óssea e o início de um quadro de osteoporose.

Mais corrida, sexo melhor
Você pode não acreditar, mas a libido sexual da mulher está mais relacionada ao seu bem-estar psicológico do que aos seus hormônios. Quem garante é a médica Mona Shangold, diretora do Centro de Saúde da Mulher e Ginecologia de Esportes, na Filadélfia (EUA), e autora de diversos livros de saúde feminina, entre eles Women and exercise: physiology and sports medicine. Com isso, a corrida gera basicamente três efeitos positivos sobre a libido feminina:
- A sensação de conforto e prazer ajuda no relaxamento, que é essencial para a mulher ter vontade de fazer sexo.
- Melhora a estética, o que faz as corredoras sentirem-se melhor e mais confortáveis com o próprio corpo e mais dispostas a terem uma relação sexual.
- Aumenta os níveis de testosterona nas mulheres que, entre outras características, é responsável pelo comportamento sexual e aumento da libido. Como o efeito é de curta duração, é melhor treinar regularmente para manter a forma: sexual e nas pistas.

Continuamos na semana que vem!


2 comentários:

Thiago disse...

MUITO legal a matéria, Rivis. E o famoso lago tem um lugarzinho de destaque no seu coração, né? rs
Algumas diferenças são óbvias, mas não imaginava que existissem tantos detalhes. A parte da diferença de força eu tenho percebido com frequência ultimamente: em provas não remuneradas, costumo cruzar a linha de chegada junto com as líderes do feminino, como neste final de semana, quando cheguei 8 segundos depois da primeira colocada nos 5km. E o que percebo é que nas partes que exigem mais força, como subidas por exemplo, o ritmo delas cai muito. Acho super legal você trazer todas essas informações, pois quando compreendemos as particularidades das mulheres, valorizamos ainda mais seu esforço e, independente de vantagens e desvantagens, homem e mulher têm desafios específicos dentro da corrida e do esporte em geral. Só que concordo parcialmente com essa parte: "as mulheres também possuem um coração menor". Menos coração de mãe, porque coração de mãe é gigante! rs
Ah! Saltou aos olhos a parte da libido ;-)

Rivania disse...

Thiago,
sim!! Lago do meu coração, mas nele gosto mesmo é de correr!

O texto é muito bacana mesmo e mostra que mulheres corredoras são guerreiras... e é verdade, guerreiras de coração grande emocionalmente, de apetite sexual intenso e muita persistência pra vencer tantas adversidades.

Obrigada pelo reconhecimento e parabéns pelos seu habitual pace "feminino" de elite!

Tem a 2a parte do texto na timeline!

Rivis